abril 09, 2007

As Ilhas como Metáfora: A Ilha da Utopia

A Ilha da Utopia
«Separadas dos continentes, salvos pelo oceano da nossa torpeza, as ilhas são o berço ideal da utopia. O filósofo Thomas More situa a sua Utopia numa ilha e não num continente: descreve um «país em lugar nenhum», um governo elevado onde desaparecem o egoísmo, a iniquidade, o belicismo, as disfunções e a depravação moral que conspurcam a Inglaterra do século XVI. Entre a esperança de outro lugar e a crítica do presente, a ilha é a metáfora geográfica dos amanhãs que cantam. É num calabouço, encarcerado entre quatro paredes, que o monge calabrês Tommaso Campanella redige A Cidade do Sol, uma nova utopia que localiza ... numa ilha, na ocorrência o Ceilão, um universo de duas por sete milhas, nos antípodas do mundo que o tortura. Heliaca pretende ser o oposto harmonioso de uma época decadente, uma cidade ordenada segundo os astros, uma paraíso sem conflitos, sem família, sem propriedade privada, nem riqueza, nem casamento verdadeiro. Os solários, essas «bestas de cérebro lodoso», são dirigidos por um monarca sábio, o «metafísico», assistido por um triunvirato («potência», «sabedoria», «amor») que regem o trabalho (quatro horas por dia), a sexualidade (eugenista e estritamente enquadrada), ou, ainda, a educação das crianças (retiradas aos pais a partir dos dois anos e educadas pelo Estado) ... Mas se as grandes utopias são insulares, nem todas são loucas ou funestas: assim, Marivaux, em A Ilha dos Escravos, eleva a comédia de costumes ao nível de uma reflexão sobre a servidão: senhores e criados desembarcam, após um naufrágio, numa cidade fundada por escravos revoltados, que os obrigam a trocar de condição, de roupas, até de nomes. Das peripécias que se seguem, Marivaux, tira a conclusão de que «a diferença de condição não passa de uma prova que os deuses nos lançam». Só uma ilha, isolada dos conjuntos, permite a suspensão dos usos e costumes, a inversão de perspectivas e um olhar liberto das convenções que nos cegam.» (texto de Raphael Enthoven; Lire, Junho 2004; Trad. de João Carlos Barradas)

Etiquetas:

1 Comments:

Blogger Pedro Ludgero said...

Relevante é o que sabemos (e o que fazemos) do espaço entre as ilhas.

12:32  

Enviar um comentário

<< Home