julho 31, 2007

Partir para Algures: Jean Arthur Rimbaud ou o Esquecimento

Philippe Soupault, também ele viajante compulsivo e infatigável, escreveu um conjunto breve de impressões de uma jornada feita em 1951 ao Mar Vermelho, também ela na busca dos trilhos perdidos de Jean Arthur Rimbaud. A memória de Soupault é um relato assombroso, onde o real e o imaginário se cruzam continuamente num contínuo desfasamento da alma e dos sentidos. Soupault traça, como Rimbaud, um périplo perigoso, e antevê o que está além. Usa os territórios e funde-se. Opera o esquecimento de si. Altera-se, vítima de uma metempsicose. Vê mais do que se pode ver, vai mais à frente do que se pode ir. Não é isso que fazem todos os que partem para algures?
O texto é belíssimo, crú, árido e vago como o Mar Vermelho. Fica aqui a última parte.
Mar Vermelho. P.S. em 1982
«O Mar Vermelho é um íman que atraiu os homens que iriam agitar os alicerces do mundo.
Não é que nos obstinemos a determinar o segredo das partidas de Rimbaud nem descobrir necessariamente o seu esquecimento da poesia, mas, mais simples do que isso, saber dos porquês do Mar Vermelho e suas margens fascinarem o viajante infatigável, nunca satisfeito, sempre à procura de novas luzes e novos mistérios.
Foi nessas margens que eu segui os itenerários traçados pelo futuro "negociante", itenerários que ele finalmente havia preferido - ele que falava em regressar a França para se casar e fazer um filho que seria "engenheiro".
Tendo procurado as pistas de Rimbaud em Londres e em Chipre, fui a Aden, via a Arábia, Harar, a Etiópia. Em 1951. Ao explorar o Mar Vermelho, vi-me metaforseado. Não foi tanto a descoberta de um universo diferente; nem a solidão; mas uma metempsicose. Je est un autre. O homem que eu acreditava ser já não se parecia comigo. Experiência dolorosa mas irreversível. Inútil lutar contra esta ruptura. O olvido.

A sombra de Rimbaud, imperceptível, era impossível não se ficar obsecado por ela. Sombras. O que o vidente não podia conhecer nem mesmo imaginar. E no entanto ...

Os que encontrei eram também eles vítimas do esquecimento. Mesmo aquele milionário, senhor Besse que, alguns anos depois da partida do negociante havia feito fortuna ao retomar por sua conta os projectos que o ardenense teve de abandonar. Mesmo aqueles fantasmas ou aqueles destroços que erravam de Djibuti a Aden sem espírito de regresso.

A última viagem, a viagem da agonia do carregador de luíses de ouro. Saberia ele que ia morrer?»

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2 Comments:

Blogger Luiz Modesto said...

Que rico tudo isso.
Ma agrada muito Mr. Rimbaud.
Muito bom teu espaço. Voltarei.

17:50  
Anonymous Andréa Trompczynski said...

Muitíssimo agradecida.
Seu blog é um deleite.
Duas reverências, Sir.

10:37  

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