março 13, 2007

Paisagem: Pajottenland: Bruegel (5)

março 09, 2007

Paisagem: Pajottenland: Bruegel (4)

Pajottenland, província de Vlaams-Brabant, Vlaanderen, Fev/Mar.2007 (Photos by RC)

Ainda e por último, as árvores. A Pajottenland, as árvores de Pieter Bruegel, l `Ancien, 500 anos depois, e os lugares da sua sequência de trabalhos intitulada De Maanden, aqui nos meses de Fevereiro e Março, como em De sondere tag (La journée sombre): Vollezele, Gooik, Leenik, Ninove, Gaasbeck, Oetingan, Enghien, St Pieters-Lieeuw.

Passagem: Pajottenland Blog

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março 07, 2007

Paisagem: Pajottenland: Bruegel (3)

De nestenrover, (Huile sur bois,1568), Pieter Bruegel, l´Ancien

Pieter Bruegel, l `Ancien pintou De nestenrover (Le dénicheur), que traduziríamos para O camponês e o pilha ninhos, um ano antes da sua morte, em 1569. Em comparação com as suas representações mais antigas, esta obra dá a impressão de que poderia ter sido pintado por um outro artista. Na verdade, a paisagem montanhosa das suas primeiras imagens, porventura, como referímos, influenciadas pela sua viajem a Itália e aos Alpes, é agora substituída pelo imenso território plano dos campos, típico, aliás, da Vlaanderen (Flandres) e da Pajottenland, a vastidão do panorama cede perante a patente aproximação a determinados elementos da natureza e a tradicional enorme multiplicidade de figuras, como por exemplo sucede em Landschap met ijsschaatsen en de vogelknip (Paysage d ´hiver avec patineurs et trappe aux oiseaux) e De volkstelling te Betlehem (Le dénombrement de Bethléem), é drásticamente reduzida, mas, em contrafundo, apresentada de uma maneira monumental. A sua concepção da paisagem, que é, como temos visto, a marca relevante da sua obra, aparece, aqui, através da forma como, nomeadamente, a luz é captada através das árvores, formal e tecnicamente inovada. Efectivamente, com De nestenrover (Le dénicheur), Bruegel contribuíu decididamente para o desenvolvimento e a importância da pintura de paisagem.

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março 02, 2007

Paisagem: Pajottenland: Bruegel (2)

Pajottenland, província de Vlaams-Brabant, Vlaanderen, Fev/Mar.2007 (Photos by RC)
Pieter Bruegel, l ´Ancien susteve a tradição dos pintores Flamengos Primitivos dos século 15, como Van Eyck e Hans Memling, mas foi além dela ao transmitir-nos nas suas representações, quer sejam as gravuras ou os óleos sobre tela, a vastidão larga das paisagens e a importância significante de cada pormenor. Com Bruegel a paisagem passa para primeiro plano, assume o comando da descrição e o movimento da cena, na qual são registadas as tragédias e as comédias humanas até ao detalhe diminuto, que muitas vezes coloca enigmas na interpretação ou suscita a dificuldade de estabelecer conexões, como se algumas das suas imagens fossem uma imensa parábola de códigos desconhecidos. Com os seis trabalhos da sua série De Maanden (Os meses), pintados entre 1564-1565, designadamente com os dois deles que aqui vimos, respectivamente De Sondere Tag e De jagers in de sneeuw, Bruegel sugeriu-nos a transição do tempo, a passagem das estações do ano e, nelas, a mudança dos sentimentos e actividades humanas. Fê-lo através da imagética da paisagem, colocando-a no primeiro plano e à frente da observação, e deu-nos a perceber que subjacente a cada uma das suas cenas e representações por vezes independentes se desenrola a ideia maior e central: a de que o tempo, o triunfo de Saturno, mais tarde ou mais cedo resgatará os panoramas e o mundo. Com De Sondere Tag, um dos trabalhos daquela série, Bruegel transmite-nos esta ideia de efemeridade, esta passagem contínua, situando-nos nos meses de Fevereiro e Março, e, por isso, na transição do Inverno (De jagers in de sneeuw) para a Primavera, naquelas que são as paisagens da Pajottenland e as aldeias da Brabant, na Flandres. As árvores que vemos no plano central de De Sondere Tag são uma constante nos trabalhos de De Maanden, como se por elas, logo à primeira, sem ser preciso mais nada, percebêssemos a transição das estações e das emoções humanas. Das árvores partimos para o resto. Como nestas, aqui, que são, na verdade, uma das presenças mais impressivas e distintas da Pajottenland e da província de Vlaams-Brabant, por vezes com formas e silhuetas que apenas distam das dos quadros de Bruegel nos séculos. As árvores são as mesmas, o tempo é que não.

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fevereiro 25, 2007

Paisagem: Pajottenland: Bruegel (1)

La Journée Sombre (Huile sur bois,1565, Série De maanden), PieterBruegel, l´Ancien

Fevereiro, princípios de Março, na Pajottenland, região da Província de Vlaams-Brabant (Flemish-Brabant), na Bélgica. Horizontalmente estamos mais ou menos na fronteira entre a Vlaaderen (Flandres) Ocidental e Oriental e, verticalmente, na transição para a Wallonne (Valónia). As árvores, altíssimas, cujos ramos despidos acinzentam o panorama, para onde quer que nos voltemos, formam renques quase geométricos que se estendem pelos prados até aos casarões acastelados de tijolo escuro e aos palheiros das quintas. A neve deixou de cair à pouco tempo, mas a lenha continua empilhada nos alpendres e nos quintais. Esta é a região de um dos maiores artistas flamengos: Pieter Bruegel, l´Ancien (1525/30-1569). Pajottenland significa o país dos "pajot", aqueles que vivem nas "pagnotes", pequenas habitações em estrutura de terra lamacenta, reforçadas a madeira e cobertas de palha. Assim, os "pajot" ou "payots" seriam os habitantes dessas casas baixas, os camponeses que viviam nos vales férteis do Noroeste da Brabant. Aqui, a natureza não só domina a paisagem, mas é, ainda, a própria matéria da paisagem, o próprio tema, a partir do qual se desenrolam e pormenorizam as tragédias e paixões humanas.

E é precisamente isso o que vemos que sucede com as pinturas e as gravuras de Bruegel. A paisagem assume o protagonismo, autonomiza-se, deixa de ser uma característica secundária das representações, um adereço das figurações de carácter religioso, designadamente dos artistas flamengos primitivos do século 15. Com Bruegel, as paisagens começam a falar por si e a natureza adquire uma importância até aí relegada para segundo plano. Esta preferência pelas paisagens largas, a perder de vista, onde os homens e as mulheres são apenas representados como detalhes mínimos, quase imperceptíveis, é manifesta nas famosas séries de Bruegel conhecidas como De grote landschappen (As paisagens vastas), de 1555-1558, e De maanden (Os meses), de 1565-1566. Ora, é óbvio, desde cedo, o interesse da arte Flamenga pela pintura de paisagem. Originalmente, a paisagem não passava de um elemento secundário para as cenas relegiosas, como por exemplo em Van Eyck. Veja-se, a este propósito, o que se passa com essa obra-prima, esse tesouro imortal que é De Aanbidding van het Lams God, que se encontra na St Baafskathedraal, em Ghent. Contudo, desde Joachim Patinir, que parece ter sido o primeiro retratista de paisagens no Sul da Holanda, as representações religiosas e mitológicas vão passar a encontrar-se subordinadas aos panoramas, os quais serão, então, o verdadeiro objecto da pintura. Patinir prefere claramente retratar as paisagens vistas de elevados pontos de observação e repletas de uma variedade de elementos naturais. Bruegel, designadamente na série De grote landschappen, vai aderir a essa tradição mas, por outro lado, desvia-se dela profundamente. Na verdade, enquanto os componentes dos trabalhos de Patinir parecem arbitráriamente combinados, Bruegel integra todos os elementos das suas paisagens numa composição visivelmente estruturada e substitui o mundo artificial de Patinir por fragmentos da natureza que nos são revelados tão realisticamente que temos a impressão que ganham vida própria. Naturalmente que a viajem que Bruegel fez a Itália teve a este respeito um impacto significativo. Viu os Alpes, e a enorme atracção que estes lhe causaram forneceu-lhe a matéria para os seus futuros trabalhos. Mas existe uma outra tradição da representação da paisagem para a qual Bruegel contribuíu significativamente. É patente em várias das suas De grote lanschappen não apenas a motivação para captar grandes cenários mas também uma enorme atenção ao detalhe, através da projecção de diversos elementos para o campo de observação. Por isso Bruegel está na esteira de uma importante evolução na arte da paisagem. Enquanto o princípio do século 16 apenas mostrou interesse pelas paisagens que ofereciam uma vista gereralista do cenário, a meio do século uma série de artistas começam a representar e a relevar pormenores da natureza de muito perto. No fundo: largueza de panorama e atenção ao detalhe. Bruegel desempenhou um papel fundamental neste desenvolvimento: nos seus trabalhos os elementos que não se encontram imediatamente à vista, os pequenos vestígios, tornam-se doravante mais importantes, até ocuparem praticamente toda a perspectiva, às vezes, inclusive, com significações estranhas, não perceptíveis, que levantam dúvidas de interpretação e sentido, como se fizessem parte de um mundo ampliado, grotesco. Com a representação, a par dos grandes panoramas, dos pormenores da natureza o interesse dos artistas flamengos nas suas paisagens consolidou-se. O fascínio de Bruegel pelo paisagem da Província de Brabant e pela região da Pajottenland está estreitamente ligado a este contexto. Mas apesar da contribuição de Bruegel para a evolução da arte da paisagem, raramente ele apresenta qualquer cena natural sem a presença de figuras humanas. As pessoas que aparecem nas suas imagens são na maioria invariavelmente camponeses, a trabalhar na natureza, a presenciar uma festa, a descansar ou como protagonistas da exemplificação de provérbios ou de contextos amorosos. É o que sucede marcadamente nas pinturas da série De maanden (Os meses), duas das quais, respectivamente, De Sombere Dag e De Jagers in de Sneeuw, estão aqui reproduzidas. De maanden entronca na tradição artística Flamenga de representar actividades humanas em diferentes estações. Nestas imagens o homem não está apenas presente na natureza, mas faz parte inalienável dela. Efectivamente, poucos pintores conseguiram captar a mudança dos sentimentos, das emoções e das estações do ano tão perfeitamente como Pieter Bruegel.

E regressamos ao ponto onde começámos: estamos na Pajottenland, mais propriamente em Vollezele, na fronteira entre a Vlaaderen (Flandres) Ocidental e Oriental. Finais de Fevereiro, princípios de Março. Em alguns lugares ainda se sente a marcada presença do Inverno, como uma ameaça que escurece a paisagem e as actividades. Nas colinas e ao logo dos território plano vai dar-se a mudança para a Primavera. A paisagem estende-se e domina. Ela é o centro, o fundamento, o acto semelhante às custódias humanas, o seu espelho, a sua passagem. É isso precisamente o que vemos na série de pinturas de Bruegel referentes aos De maanden (Os meses), e, aqui, concretamente em De Sombere Dag e em De Jagers in de Sneeuw.

De Sombere Dag, a representação respeitante aos meses de Fevereiro e Março, é a última da série De maanden, e mostra a transição do Inverno para a Primavera. À direita um agricultor, um "pajot" corta os ramos das árvores e outro recolhe a madeira. Outro homem renova, como é habitual nesta época do ano, as fachadas da sua casa, provavelmente uma "pagnote". Entretanto, dois camponeses alegres comem algumas wafels e uma criança, de mão dada com uma mulher, usa uma coroa de papel, numa clara alusão ao Carnaval. À esquerda do quadro um homem prepara a sua carroça, um músico toca flauta à porta de uma hospedaria, um homem urina contra a parede de uma casa e uma mulher e o seu filho parecem passar um mau bocado enquanto são perseguidas pelo seu marido e pai embriagados. Toda a cena desta pintura de Bruegel decorre ao entardecer, com algumas áreas, como os picos das montanhas nevadas e a fachada da casa, já iluminadas. Contudo, as montanhas em fundo revelam a presença latente do frio e da neve. A tempestade é também eminente. Mas as árvores que aparecem no centro da imagem constituem um ponto fixo e de mudança na paisagem ainda tormentosa. Estamos a presenciar a transição que se dá nas estações do ano em Fevereiro e Março.

Na verdade o pico do Inverno, dos meses de Dezembro e Janeiro já passou. O compasso do branco da neve e do verde-azul do céu gelado dará progressivamente lugar ao verde e amarelo, que já se entrevê, como vimos, em De Sombere Dag. O que não sucedia com De Jagers in de Sneeuw, a paisagem anterior, a de Inverno, da séria De maanden, de Bruegel. Aqui, onde três caçadores, acompanhados pelos seus cães, regressam a casa com a sua magra caça, enquanto à porta da estalagem "In den hert" uma fogueira está a ser acesa, tudo o resto, os homens, as casas, as aves, estão representados numa cor sombria, a qual se opõe à concepção das cores da vida, que já se adivinham em De Sombere Dag. De contrário, em De Jagers in de Sneeuw o Inverno ocupa toda a extensão da paisagem, a qual é, na sua vastidão fria, acentuada pelo voo da ave que se encontra à direita, talvez num prenúncio da morte e da solidão do Inverno.

Pieter Bruegel, l ´Ancien soube como poucos dar-nos essa transição da vida e do tempo, das estações e dos homens, nas suas paisagens. Como tão marcadamente vai sucedendo, neste momento, na Pajottenland, onde viveu e andou, e aqui, em Vollezele.

De Jagers in de sneeuw (Huile sur bois,1565, Série De maanden), PieterBruegel, l´Ancien

Passagem: Vlaams-Brabant; Vlaaderen

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