fevereiro 25, 2007

Paisagem: Pajottenland: Bruegel (1)

La Journée Sombre (Huile sur bois,1565, Série De maanden), PieterBruegel, l´Ancien

Fevereiro, princípios de Março, na Pajottenland, região da Província de Vlaams-Brabant (Flemish-Brabant), na Bélgica. Horizontalmente estamos mais ou menos na fronteira entre a Vlaaderen (Flandres) Ocidental e Oriental e, verticalmente, na transição para a Wallonne (Valónia). As árvores, altíssimas, cujos ramos despidos acinzentam o panorama, para onde quer que nos voltemos, formam renques quase geométricos que se estendem pelos prados até aos casarões acastelados de tijolo escuro e aos palheiros das quintas. A neve deixou de cair à pouco tempo, mas a lenha continua empilhada nos alpendres e nos quintais. Esta é a região de um dos maiores artistas flamengos: Pieter Bruegel, l´Ancien (1525/30-1569). Pajottenland significa o país dos "pajot", aqueles que vivem nas "pagnotes", pequenas habitações em estrutura de terra lamacenta, reforçadas a madeira e cobertas de palha. Assim, os "pajot" ou "payots" seriam os habitantes dessas casas baixas, os camponeses que viviam nos vales férteis do Noroeste da Brabant. Aqui, a natureza não só domina a paisagem, mas é, ainda, a própria matéria da paisagem, o próprio tema, a partir do qual se desenrolam e pormenorizam as tragédias e paixões humanas.

E é precisamente isso o que vemos que sucede com as pinturas e as gravuras de Bruegel. A paisagem assume o protagonismo, autonomiza-se, deixa de ser uma característica secundária das representações, um adereço das figurações de carácter religioso, designadamente dos artistas flamengos primitivos do século 15. Com Bruegel, as paisagens começam a falar por si e a natureza adquire uma importância até aí relegada para segundo plano. Esta preferência pelas paisagens largas, a perder de vista, onde os homens e as mulheres são apenas representados como detalhes mínimos, quase imperceptíveis, é manifesta nas famosas séries de Bruegel conhecidas como De grote landschappen (As paisagens vastas), de 1555-1558, e De maanden (Os meses), de 1565-1566. Ora, é óbvio, desde cedo, o interesse da arte Flamenga pela pintura de paisagem. Originalmente, a paisagem não passava de um elemento secundário para as cenas relegiosas, como por exemplo em Van Eyck. Veja-se, a este propósito, o que se passa com essa obra-prima, esse tesouro imortal que é De Aanbidding van het Lams God, que se encontra na St Baafskathedraal, em Ghent. Contudo, desde Joachim Patinir, que parece ter sido o primeiro retratista de paisagens no Sul da Holanda, as representações religiosas e mitológicas vão passar a encontrar-se subordinadas aos panoramas, os quais serão, então, o verdadeiro objecto da pintura. Patinir prefere claramente retratar as paisagens vistas de elevados pontos de observação e repletas de uma variedade de elementos naturais. Bruegel, designadamente na série De grote landschappen, vai aderir a essa tradição mas, por outro lado, desvia-se dela profundamente. Na verdade, enquanto os componentes dos trabalhos de Patinir parecem arbitráriamente combinados, Bruegel integra todos os elementos das suas paisagens numa composição visivelmente estruturada e substitui o mundo artificial de Patinir por fragmentos da natureza que nos são revelados tão realisticamente que temos a impressão que ganham vida própria. Naturalmente que a viajem que Bruegel fez a Itália teve a este respeito um impacto significativo. Viu os Alpes, e a enorme atracção que estes lhe causaram forneceu-lhe a matéria para os seus futuros trabalhos. Mas existe uma outra tradição da representação da paisagem para a qual Bruegel contribuíu significativamente. É patente em várias das suas De grote lanschappen não apenas a motivação para captar grandes cenários mas também uma enorme atenção ao detalhe, através da projecção de diversos elementos para o campo de observação. Por isso Bruegel está na esteira de uma importante evolução na arte da paisagem. Enquanto o princípio do século 16 apenas mostrou interesse pelas paisagens que ofereciam uma vista gereralista do cenário, a meio do século uma série de artistas começam a representar e a relevar pormenores da natureza de muito perto. No fundo: largueza de panorama e atenção ao detalhe. Bruegel desempenhou um papel fundamental neste desenvolvimento: nos seus trabalhos os elementos que não se encontram imediatamente à vista, os pequenos vestígios, tornam-se doravante mais importantes, até ocuparem praticamente toda a perspectiva, às vezes, inclusive, com significações estranhas, não perceptíveis, que levantam dúvidas de interpretação e sentido, como se fizessem parte de um mundo ampliado, grotesco. Com a representação, a par dos grandes panoramas, dos pormenores da natureza o interesse dos artistas flamengos nas suas paisagens consolidou-se. O fascínio de Bruegel pelo paisagem da Província de Brabant e pela região da Pajottenland está estreitamente ligado a este contexto. Mas apesar da contribuição de Bruegel para a evolução da arte da paisagem, raramente ele apresenta qualquer cena natural sem a presença de figuras humanas. As pessoas que aparecem nas suas imagens são na maioria invariavelmente camponeses, a trabalhar na natureza, a presenciar uma festa, a descansar ou como protagonistas da exemplificação de provérbios ou de contextos amorosos. É o que sucede marcadamente nas pinturas da série De maanden (Os meses), duas das quais, respectivamente, De Sombere Dag e De Jagers in de Sneeuw, estão aqui reproduzidas. De maanden entronca na tradição artística Flamenga de representar actividades humanas em diferentes estações. Nestas imagens o homem não está apenas presente na natureza, mas faz parte inalienável dela. Efectivamente, poucos pintores conseguiram captar a mudança dos sentimentos, das emoções e das estações do ano tão perfeitamente como Pieter Bruegel.

E regressamos ao ponto onde começámos: estamos na Pajottenland, mais propriamente em Vollezele, na fronteira entre a Vlaaderen (Flandres) Ocidental e Oriental. Finais de Fevereiro, princípios de Março. Em alguns lugares ainda se sente a marcada presença do Inverno, como uma ameaça que escurece a paisagem e as actividades. Nas colinas e ao logo dos território plano vai dar-se a mudança para a Primavera. A paisagem estende-se e domina. Ela é o centro, o fundamento, o acto semelhante às custódias humanas, o seu espelho, a sua passagem. É isso precisamente o que vemos na série de pinturas de Bruegel referentes aos De maanden (Os meses), e, aqui, concretamente em De Sombere Dag e em De Jagers in de Sneeuw.

De Sombere Dag, a representação respeitante aos meses de Fevereiro e Março, é a última da série De maanden, e mostra a transição do Inverno para a Primavera. À direita um agricultor, um "pajot" corta os ramos das árvores e outro recolhe a madeira. Outro homem renova, como é habitual nesta época do ano, as fachadas da sua casa, provavelmente uma "pagnote". Entretanto, dois camponeses alegres comem algumas wafels e uma criança, de mão dada com uma mulher, usa uma coroa de papel, numa clara alusão ao Carnaval. À esquerda do quadro um homem prepara a sua carroça, um músico toca flauta à porta de uma hospedaria, um homem urina contra a parede de uma casa e uma mulher e o seu filho parecem passar um mau bocado enquanto são perseguidas pelo seu marido e pai embriagados. Toda a cena desta pintura de Bruegel decorre ao entardecer, com algumas áreas, como os picos das montanhas nevadas e a fachada da casa, já iluminadas. Contudo, as montanhas em fundo revelam a presença latente do frio e da neve. A tempestade é também eminente. Mas as árvores que aparecem no centro da imagem constituem um ponto fixo e de mudança na paisagem ainda tormentosa. Estamos a presenciar a transição que se dá nas estações do ano em Fevereiro e Março.

Na verdade o pico do Inverno, dos meses de Dezembro e Janeiro já passou. O compasso do branco da neve e do verde-azul do céu gelado dará progressivamente lugar ao verde e amarelo, que já se entrevê, como vimos, em De Sombere Dag. O que não sucedia com De Jagers in de Sneeuw, a paisagem anterior, a de Inverno, da séria De maanden, de Bruegel. Aqui, onde três caçadores, acompanhados pelos seus cães, regressam a casa com a sua magra caça, enquanto à porta da estalagem "In den hert" uma fogueira está a ser acesa, tudo o resto, os homens, as casas, as aves, estão representados numa cor sombria, a qual se opõe à concepção das cores da vida, que já se adivinham em De Sombere Dag. De contrário, em De Jagers in de Sneeuw o Inverno ocupa toda a extensão da paisagem, a qual é, na sua vastidão fria, acentuada pelo voo da ave que se encontra à direita, talvez num prenúncio da morte e da solidão do Inverno.

Pieter Bruegel, l ´Ancien soube como poucos dar-nos essa transição da vida e do tempo, das estações e dos homens, nas suas paisagens. Como tão marcadamente vai sucedendo, neste momento, na Pajottenland, onde viveu e andou, e aqui, em Vollezele.

De Jagers in de sneeuw (Huile sur bois,1565, Série De maanden), PieterBruegel, l´Ancien

Passagem: Vlaams-Brabant; Vlaaderen

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fevereiro 20, 2007

Imenso Mediterrâneo Branco (2)

Predrag Matvejevitch atravessou o imenso mar interior, o imenso Oeste branco do Mediterrâneo de um lado a outro, desde as planícies croato-panónias às areias da Tunísia, da vertente dos Apeninos às gargantas do Montenegro, acima de Kotor, das Cíclades gregas ao arquipélago italiano das Lipari, do norte da Líbia ao litoral turco, passando pela Síria, de Marselha a Alexandria, de Atenas a Roma, do mediterrâneo católico ao mediterrâneo ortodoxo, da cultura da oliveira ao scirocco, entre o Fásis e as Colunas de Hércules. Desenhou curvas, contou as fronteiras, seguiu as cartas e os mapas, orientou-se pelo voo das gaivotas e pela espessura da espuma das ondas, subiu aos mosteiros, aos meteoros da Grécia, avançou para dentro das terras, viu como algumas são ainda mais marítimas do que outras que se encontram na orla, deteve-se nas capitanias, nos pontões abandonados, traçou os limites, as rotas, ouviu as fábulas, as superstições e as línguas antigas, regionais, costeiras, cheirou as redes e as tintas das embarcações, reparou nos molhes a esfumarem-se no azul e parou por fim, em oração, a contemplar o que viu. De tudo, e por tudo, ofereceu-nos esse itinerário indefinível, essa mistura de poema, romance e ensaio, de investigação histórica e tratado de filosofia, esse breviário barroco e infinito, a obra inesquecível, leve e solar como mar que a envolve, que é Mediteranski Brevijar. Robert Bréchon, que assina o Posfácio, intitulado, Cenas de um Mundo Terráqueo, escreve: «Predrag Matvejevitch percorreu do mesmo passo o espaço e o tempo do Mediterrâneo. Viu com os seus próprios olhos grande parte das suas margens. Armazenou grande parte do saber que se foi acumulando desde que há quatro mil anos ali há homens que navegam, pescam, pensam, fazem a guerra, constroem cidades. O que caracteriza o Mediterrâneo é uma relação singular entre a terra, o mar e o homem». Claudio Magris, que introduz o livro, concretiza: «A cultura e a história mergulham directamente nas coisas, nas pedras, nas rugas dos rostos humanos, no gosto do vinho e do azeite, na cor das ondas. Matvejevitch tenta agarrar o Mediterrâneo, abandonar-se ao encanto desta palavra, mas também circunscrever rigorosamente o seu sentido, traçar limites e fronteiras. Segue as diversas rotas mediterrânicas, as do tráfico do âmbar e das peregrinações dos Judeus sefardins, da área da vinha e do curso dos rios; as fronteiras tornam-se então movediças e ondulantes: embora coerentes e concêntricas, desenham curvas ideais como as linhas isóbaras ou como as cristas das ondas».
Rovinj, Ístria, Croatia, Set.2005 (photo by RC)
Predrag, o geógrafo, o historiador, o narrador, o poeta, por vezes deixa de lá estar. Deixa-nos sós, parte por cima das areias que se estendem das praias do Norte de África à Córsega e reaparece subitamente nos rochedos isolados do mar e na Républica da Ragusa ou em Veneza. Enquanto nos deixa sós, deixa-nos com tudo o que é imenso em tão pouco. Deixa-nos com cada palavra e frase, com cada voz que repete até à exaustão a aventura mediterrânica. Não podemos pretender mais. Predrag encarna a própria cor e ondulação do mediterrâneo, que, como ele mesmo refere, têm a sua natureza e consistências próprias consoante cada corrente ou ponto indefinido do mar. Temos a sensação de que abandona os navios e as embarcações, as cidades e dos territórios marcados para se retirar para os faróis, de onde nos envia notícias e relatos de uma espécie de desaparecimento. Matvejevitch torna-se um viajante em todos os sentidos, mesmo que um deles o seja apenas à roda do seu quarto. Magris assentua, na sua Introdução (Para uma Filologia do Mar): «Ao lermos este breviário temos por vezes a impressão de que aquele que fala é um desses homens mencionados no próprio livro, que viveram diante do mar, guardando faróis e realizando dicionários de marinharia. Mas hoje em dia todo o verdadeiro Ulisses deve vestir, além da sua blusa do marinheiro, um roupão, como ainda não há muito escrevia Giorgio Bergamini, e aventurar-se pelas sua biblioteca dentro, tanto ou até mais que por entre as ilhas perdidas; o Ulisses contemporâneo deve ser um perito na distanciação do mito e no exílio da natureza, uma explorador da ausência e da deserção da vida verdadeira». O Mediterrâneo pode pois tornar-se uma biografia, um interminável palimpsesto, um movimento que toma conta de nós e nos conduz para lugares incertos, aonde somos acompanhados por gaivotas solitárias, nas quais veremos notícias de uma esperança ou de desastres, com o Mediterrâneo estendendo-se a toda a volta cada vez mais branco.
Retomemos, neste sentido, Matvejevitch, em um dos momentos iniciais de Mediteranski Brevijar (ainda acompanhando a edição portuguesa da Quetzal, com tradução de Pedro Tamen):
«O lugar donde partimos importa menos que aquele aonde chegamos. Porque ora todos os mares parecem formar um só, sobretudo quando é longa a viagem, ora cada uma deles nos parece ser outro mar. Partamos, por exemplo, do Adriático. Daqui, o litoral setentrional, desde Málaga ao Bósforo, está mais próximo e é mais acessível. No Sul, de Haifa até Ceuta, tornam-se mais raras as baías e os portos. Percorri de ilha em ilha o mar Jónio e o mar Egeu, entre Cíclades e Espórades, em busca das suas semelhanças e das suas diferenças. Comparei a Sicília e a Córsega, Maiorca e Minorca. Não fiz escala em todas as costas. Demorei-me mais tempo nos lugares onde os rios desaguam. É difícil conhecer todo o Mediterrâneo.»

Depois, daí para a frente, quanto mais conhecemos mais nos perdemos. Então, como qualquer memória, lugar ou visitação, e nos momentos em que um lado luminoso nos esquece em direcção a um outro que registámos na nossa consciência, o Mediterrâneo adquire para nós e para todos os que nele viveram e morreram o carácter de uma deriva contínua, de uma metáfora.

E se quisermos, porque a tal iriam ter, mais tarde ou cedo, os seguimentos que poderíamos sugerir para a linha seguinte, pela qual seríamos conduzidos ao princípio ou ao fim, consoante a perspectiva ou o momento: também o carácter de um destino, tantas vezes associado a um ponto cardeal ou a uma latitude no horizonte:

«A gente do Norte assimila muitas vezes Sul e Mediterrâneo: qualquer coisa a atrai para ele, mesmo quando permanece apegada à sua terra natal. Mais que a simples necessidade de um sol quente e de uma luz mais viva. Não sei se é permitido qualificar isto de «fé no Sul». É possível uma pessoa, independentemente do lugar onde nasceu e onde vive, tornar-se mediterrânica. A mediterraneidade não se herca, adquire-se. É uma distinção, não uma vantagem. Não se trata apenas de história ou de tradições, de geografia ou de raízes, de memória ou de crenças: o Mediterrâneo é também um destino

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fevereiro 16, 2007

Imenso Mediterrâneo Branco (1)

Na Antiguidade conta-se que a cada ponto cardeal correspondia uma côr. O Mar Vermelho correspondia ao Leste; o vermelho indicava o Leste. O Norte era assinalado pelo negro, como o Mar Negro. O Oeste é o branco, o branco do imenso mar interior, o mar de Mediteranski Brevijar (Breviário Mediterrânico), o livro solar, a epifania de Predrag Matvejevitch. Sei que a edição portuguesa, da Quetzal, de 1994, está esgotada há muito. Ouvi dizer em tempo que iria haver uma reedição, mas nem sinal. Comprei o livro nos anos 90 e depois perdi-o. Por ventos mediterrânicos, talvez o maestral, e após anos de tentativas falhadas, um dia dei de caras com ele num alfarrabista do Bairro Alto, que, aliás, já me levou a outras preciosidades desaparecidas. Enquanto não conseguia o livro em Portugal arranjei uma edição francesa da Fayard. Entretanto também o procurei na Croatia, em Dubrovnik, numa livraria da Placa Stradum, e em Rijeka, mas não havia. Entre nós a tradução para a Quetzal foi feita por Pedro Tamen a partir da versão francesa aprovada pelo autor. A obra que Matvejevitch escreveu em 1987 é simplesmente genial. É difícil de classificar, tanto que, já de si, é ela mesma um verdadeiro breviário de géneros, um livro com muitos livros dentro: romance, poesia, ensaio, narrativa de viagens, relato imaginário, registo real e fragmentado, escrita de divulgação científica, abordagem histórica, política e geográfica, tratado filosófico. Breviário Mediterrânico é composto por três partes: Breviário, Cartas e Glossário, as quais são no fundo três diferentes formas e tonalidades de tratar o mesmo assunto. A Introdução, intitulada Para uma Filologia do Mar, é de um outro grande andarilho europeu, Claudio Magris, que escreveu um ano antes, em 1986, Danúbio, outro livro também ele fabuloso, do fôlego e cariz deste Mediteranski Brevijar, só distinta na incidência geográfica e no itinerário. O Posfácio do livro tem como título Cenas de um Mundo Terráqueo e é de Robert Bréchon. Magris escreve na Introdução que a obra de Predrag se assemelha ao empreendimento do relojoeiro catalão (que Matvejevitch conhecera em Alexandria e que apaixonadamente, e contra uma falta exorbitante de dados, estava a reconstituir o catálogo da famosa biblioteca destruída pelo sultão Omar), no que mistura de rigor e de temeridade, de precisão científica e de epifania do infinito. Ainda Magris: «Que livro é este, que com requintada discrição desafia os géneros literários? O Mediterrâneo de Matvejevitch, ele mesmo o diz, não é apenas o espaço histórico-cultural, estudado magistralmente e talvez definitivamente por Braudel, nem o espaço místico-lírico celebrado por Gide ou por Camus. Obra fascinante, que ao mesmo tempo tem algo de portulano, de léxico e de ensaio/romance assente numa absoluta fidelidade ao real, o livro de Matvejevitch pode levar a pensar, na sua total autonomia e na sua diversidade, em La Mer de Michelet, outro livro estranho e genial, em que o grande historiador, depois de ter sondado nos arquivos a história da França e a da Revolução, consagra a sua atenção infatigável à estratificação geológica das costas e aos faróis, às conchas e à flora oceânicas, às estações balneares e às histórias de sereias.» O registo de Matvejevitch é desconcertante. Prende-nos e envereda por caminhos que não esperaríamos. Detem-se no que julgamos acessório quando na verdade se trata do essencial, suspende-se nos pormenores, em cada grão de areia, em vez de se alargar nos sentidos latos e visíveis, leva-nos numa vista aérea, leve, a abarcar o mínimo de cada possibilidade. Magris determina (vale a pena seguir o texto): «lê o mundo, a realidade, os gestos e as entoações das pessoas, o estilo das capitanias, a meneira indefinível como a natureza se prolonga sub-repticiamente na história e na arte, como as formas das costas se vão reencontrar nas da arquitectura, a influência no traçado das fronteiras da cultura da oliveira, da extensão de uma religião ou da migração das enguias, as histórias e os destinos cuja lembrança é guardada pelos glossários náuticos e pelas línguas desaparecidas, a linguagem das ondas e a dos cais, as gírias e falares que mudam imperceptivelmente no espaço e no tempo». E remata em Para uma Filologia do Mar: «O potamólogo que, no livro Danúbio, tentou sobretudo exprimir a grande nostalgia do mar, e em especial do Adriático, inveja fraternalmente o talassólogo Matvejevitch; e alegra-me que o Danúbio se lance no mar, apesar de, infelizmente, o fazer no Mar Negro e não no Mediterrâneo». Por sua vez, Robert Bréchon escreve no Posfácio que o texto de Predrag é o equivalente, para a geografia, do que Marguerite Yourcenar fizera para a história ao recriar o interior da personagem Adriano (...) e situa-se na faixa estreita que permaneceu livre entre o discurso académico e o discurso «poetizante». E analisa a três partes do livro: «o Breviário é o catálogo dos tópicos de todos os discursos possíveis sobre o Mediterrâneo: portos, ilhas, ventos, correntes, costas, faróis, terrenos, línguas, utensílios, migrações, batalhas navais, etc. (...) Este texto apresenta-se ao mesmo tempo como uma suma de conhecimentos rigorosos e como o resumo de uma enciclopédia infinita. É escrito como um poema, numa prosa cheia de imagens, ritmada e, poderíamos dizer, rimada pelo retorno, no fim de cada fragmento, do vocábulo que esta repetição encantatória sacraliza até ao fim: «Mediterrâneo»; (...) as Cartas tornam concretamente visíveis os lugares mediterrânicos. A carta geográfica é um outro espaço da viagem, é uma viagem, e o autor por lá deambulou tanto ou mais que por terra ou por mar. (...) Por fim, o Glossário retoma todos os temas do Breviário e das Cartas, para explicar os termos, comentar os relatos, indicar as fontes, fornecer as referências, aludir até, aqui e além, às circunstâncias da composição do livro.»
Predrag Matvejevitch começa assim: é o primeiro parágrafo, dá-nos logo aí o tom de todo o texto:
«Não sabemos ao certo até onde vai o Mediterrâneo, nem que parte do litoral ocupa, nem onde acaba, tanto em terra como no mar. Para os Gregos, de Leste para Oeste, estendia-se do Fásis, no Cáucaso, até às Colunas de Hércules; consideravam implícita a sua fronteira natural a Norte e às vezes não se preocupavam com os seus limites a Sul. Os sábios da Antiguidade ensinavam que os confins do Mediterrâneo se situam onde a oliveira se detém. Nem sempre nem em toda a parte é assim: há lugares na costa que não são marítimos, ou que o são menos que outros, mais afastados dela. Há lugares em que o continente não se alia ao mar, em que se revela difícil a concordância entre eles. Noutros pontos, o carácter mediterrânico abrange mais vastas porções do continente, penetra-as mais com a sua influência. O Mediterâneo não é apenas uma geografia
E mais à frente: para as ilhas - como o será para as penínsulas, os golfos, as capitanias, as costas, os mosteiros:
«As ilhas são lugares peculiares. Classificam-se de acordo com critérios diversos: a sua distância da costa, a natureza do canal que dela as separa, a possibilidade de lá chegar a remos ou a nado. É nelas que melhor se percebe como o mar aproxima e como divide. As ilhas distinguem-se igualmente pela imagem que oferecem ou pela impressão que deixam: umas parecem flutuar ou afundar-se, outras parecem ancoradas ou petrificadas; estas não passam de fragmentos incompletos, arrancados à costa, aquelas largaram a tempo o continente e, independentes, bastam-se a si mesmas. Algumas permanecem numa desordem e num abandono mais ou menos completos, enquanto noutras tudo está arrumado, a ponto de se acreditar que é possível fazer reinar uma ordem ideal. Atribuem-se às ilhas estados de alma ou características humanas: também elas são solitárias, tranquilas, sequiosas, nuas, desertas, desconhecidas, malditas, afortunadas, às vezes felizes ou abençoadas. Não se agrupam apenas segundo as suas semelhanças, mas também de acordo com as suas conexões. A Antiguidade oferece-nos dois modelos de divisão: as Espórades e as Cíclades no mar Egeu (este tipo de ordenação serviu de modelo a certas ordens monásticas, os cenobitas, por exemplo, ou os anacoretas). As Baleares com as Pitiúsas, as Kornat adriáticas, o pequeno arquipélago das Elafitas, perto de Dubrovnik, o das ilhas de Hyères entre o golfo do Leão e a «Côte d`Azur» e, mais abaixo, Querquena no Sul da Tunísia, as ilhas Lipari, ou ainda o arquipélago toscano entre o mar Tirreno e a costa da Ligúria, são agrupados de modo semelhante. Certas ilhas carregadas de história, Malta, por exemplo, com a sua ordem de cavalaria, a Sicília, com um glorioso passado, e talvez a Córsega, apelidada de «ilha da beleza», não aguentam generalizações. Os ilhéus, em especial quando não possuem água potável nem dolinas, são os mais abandonados: os que não se integram num arquipélago perdem o seu lugar no protocolo da costa e ficam para sempre órfãos, celibatários ou dissidentes. Os escolhos que enxameiam as proximidades das ilhas inspiraram relatos de horror e de fantasmas: no Mediterrâneo, mais que em qualquer outro lado, acredita-se em contos.»

Matvejevitch é croata, nasceu a cerca de 50 km da belíssima costa da Dalmácia, em Mostar, na Herzegovina, ao que não será de forma nenhuma alheio o pendor do Breviário Mediterrânico. «Em Mostar, diz ele, sopram os ventos do mar. Debaixo da velha ponte turca voam guinchos de uma espécie marinha; muitas vezes, pelo meio dia, o mistral». É professor em importantes universidades da Europa, eminente especialista em estudos românicos da Universidade de Zagreb, autor dessa brilhante obra de crítica historiográfica que é Pour une poétique de l´événement (1979), uma grande voz da Mitteleuropa e das planícies croato-panónias, um dos mais distintíssimos intelectuais europeus do nosso tempo e, afinal, inventor, como diz Bréchon, de uma nova arte de escrever, com este magistral Mediteranski Brevijar. Em criança, quando vivia em Sibenik, na costa dálmata, deixava-se fascinar pelos rios e pelas costas mediterrânicas e a si mesmo perguntava porque é que a faixa litoral é por vezes tão estreita e tão curta, e porque é que as gentes que vivem na costa têm outros hábitos e cantam outras canções. Matvejevitch é ainda autor de outros textos fundamentais, tais como Epistolaire de L´Autre Europe, de 1993 (entre nós: Epistulário Russo, também publicado pela Quetzal, em 1995, igualmente com tradução de Pedro Tamen e Introdução de Robert Bréchon), L´île Méditerranée/Photographies de Mimmo Jodice, que recomendo vivamente e pode ler-se como uma espécie de súmula de Breviário Mediterrânico, e esse não menos belíssimo périplo poético por uma Veneza latente e invisível, um outro autêntico breviário, no tom e no conteúdo, mais do que obrigatório para os amantes da cidade do Adriático, intitulado Druga Venecija (L´Autre Venise), que se pode encontrar também na Fayard. Mediteranski Brevijar é um livro como deviam ser muitos livros: cada palavra e frase pressentem uma infinitude de outras coisas, uma evocação, uma enumeração, uma análise e um itinerário exaustivo. Passa por nós como o vento que nos branqueia a cara à vista do arquipélago das Elafitas, em Dubrovnik, ou com os reflexos do brilho da água quente de Rovinj, na Ístria. Breviário Mediterrânico é uma viagem como deveria ser cada viagem: completa, com o seu «alegre saber», e gradualmente mais leve e parecida com um fantasma de si própria: na memória e na nostalgia. Como um imenso mediterrâneo branco.

Passagem: Outros textos de Predrag Matvejevitch, em La Revue des Ressources, linkada aqui ao lado em Literature & Poetry

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fevereiro 15, 2007

Tempo di Viaggio: uma Nostalghia (6)

Nostalghia (1983), Andrej Tarkovszkij
«Em outros tempos chegavam à ponte das candeias
multidões em penitência suplicando graças
para os soldados da guerra, as histórias de amor,
as doenças, para ganhar dinheiro, juventude,
para desejos secretos, por exemplo muitos homens
desentendiam-se com a sua gaita,
se lhe diziam: preparada? Ela respondia: não!
Bastava cruzar a ponte com uma vela acesa
que não podia apagar-se até à cruz do moinho.
Mas o vento soprava, uma brisa descia
da montanha e as mãos fatigavam-se
de tanto proteger a chama e então toca a tentar,
tentar de novo, um mês, um ano ...
A uma velha quase a chegar ao fim
pegou-se-lhe fogo à roupa e lá se foi tudo, roupa, tempo e feitio.
Desde essa desgraça os crentes
abandonaram a devoção e mais ninguém lá vai.
No passado domingo dei uma espreitadela à ponte
e vi o filho tolo de Filomena
com uma vela acesa na mão.
A chama estava firme e nem a brisa do fundo
do rio a movia. Qual será a graça que suplica?
Uma vida normal ou continuar a sua loucura?
Antes de chegar à cruz do caminho
logo ali, a dois passos, parou
e soprou sobre o lume.»
(Canto Décimo Sexto. Poema de Tonino Guerra, soletrado em Nostalghia. Guerra, Tonino. E`Mel. O Mel. Trad. de Mário Rui Oliveira; Lisboa: Assírio & Alvim, 2004).

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fevereiro 12, 2007

Tempo di Viaggio: uma Nostalghia (5)

Mother of God, by Vladimir (século XII)
Uma imagem serve uma lembrança. A partir daí podemos entrar num dos elementos essênciais do acto criador. A recordação, a imagem, seja ela memorizada ou presencial, é a evocação pessoal que o artista faz, numa dinâmica de liberdade, a partir de algo que interioriza ou interiorizou. Neste contexto, a capacidade de lembrar lugares determinados, sejam aqueles pelos quais passámos ou porque já faziam parte, mesmo antes de existirem, das nossas sensações, pode transportar-nos, dentro daquela liberdade (o tal vogando livres, como já aqui vimos a propósito do que poderá separar Brodsky e a Rua dos Douradores), e dentro da nostalgia correspondente, para a missão do artista e do significado da arte e, por isso, indo mais longe, para os limites ténues da vida, do tempo e de Deus.
Acompanhemos, a este propósito, ainda o Diari: Martirologio e Sculpting in Time, donde, respectivamente, retiramos os seguintes dois registos de Andrej Tarkovszkij:
11.Nov.1981: «I do not know why - I remembered how, when I was in Italy, I found an icon, the Vladimir Mother of God, displayed in the ancient little church on the seashore. And how the trembling sweetness that I felt in my soul seemed to arise from a kind of impatience, the wait for some joyous event that would surely come to pass».
«Devoid of spirituality, art carries its own tragedy within it. For even to recognize the spiritual vacuum of times in which he lives, the artist must have specific qualities of wisdom and understanding. The true artist always serves immortality, striving to immortalize the world and man within the world».
Mais em pormenor, e como súmula, ainda de Sculpting in Time (Tarkovszkij, Andrej. Sculpting in Time; Esculpir o Tempo. Trad. de Jefferson Luiz Camargo. São Paulo: Martins Fontes, 1998), Tarkovszkij escreve:
«Quando falo de poesia, não penso nela como género. A poesia é uma consciência do mundo, uma forma específica de relacionamento com a realidade. Assim, a poesia tormna-se uma filosofia que conduz o homem ao longo de toda a sua vida. Lembremo-nos do destino e da personalidade de um artista como Alexander Grin que, morrendo de fome, foi para as montanhas com arco e flecha a ver se caçava algo com que pudesse alimentar-se. Relacionemos esse fato com a época em que este homem viveu, e tal relação nos revelará a figura trágica de um sonhador. Pensemos também no destino de Van Gogh. Pensemos em Prishvin, cujo próprio ser emerge das características daquela natureza russa (a tal nostalgia russa) que ele descreveu tão apaixonadamente. Pensemos em Mandelstam, em Pasternak, Chaplin, Dovjenko, Mizoguchi, para nos darmos conta da imensa força emocional dessas figuras sublimes que pairam altíssimo sobre a terra, e nas quais o artista aparece não como um mero explorador da vida, mas como alguém que cria incalculáveis tesouros espirituais e aquela beleza especial que pertence apenas à poesia. Tal artista é capaz de perceber as características que regem a organização poética da existência. Ele é capaz de exprimir a verdade e a complexidade profundas das ligações imponderáveis e dos fenómenos ocultos da vida».
Além disto é difícil dizer mais. De um Tempo di Viaggio para a imagem e para o definitivo momento da recordação. Tudo se desmembra agora. Torna-se num vislumbre de algo que emana do destino e se refunde numa Nostalghia ou nas nostalgias de cada um e de cada viagem. Chegamos a Deus, à transcendência, ou aos seus significados. Mas mesmo assim, e para dar expressamente de frente com Ele (Diari: Martirologio, 11.Jun.1982):
«In my opinion, when we talk about God making man in His own image and likeness, we should understand that the likeness has to do with His essence, and this is creation. From this comes the possibility of evaluating a work and waht it represents. In short, the meaning of art is the search for God in man».

Nostalghia (1983), Andrej Tarkovszkij

«The unbroken moment that comes to life within the images of Andrey Tarkovsky`s films and photographs is transfigured and becomes an unbroken moment of contemplation for those of us who look at them, making every image become a part of our lives, a memory of our own personal experience. The winged figure of an angel comes to rest, luminous in the surrounding darkness, like a visible presence of heaven on earth: a presence hidden by a veil, a presence that cannot be described except by the action of showing another invisible presence to our watching gaze» (Giovanni Chiaramonte in The Image as Remembrance. Instant Light - Tarkovsky Polaroids. Edited by Giovanni Chiaramonte and Andrey A. Tarkovsky. London: Thames & Hudson, 2004).

Passagem: Tarkovsky Polaroids

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fevereiro 07, 2007

Tempo di Viaggio: uma Nostalghia (4)

A sequência italiana de Andrej Tarkovszkij e Tonino Guerra em Tempo di Viaggio termina nas colinas da Toscana, na província de Siena, nas termas de Bagno Vignoni, na bruma que de manhã se levanta da piscina de Santa Caterina da Siena. Tonino, sobre essa busca de Nostalghia, e sobre as imagens que essa busca e o seu encontro possibilitou, escreverá:

«We travelled extensively from Naples soutwards, where he was struck by the beauty of the Baroque architecture of Lecce and the vision of Trani Cathedral. By the time we finnaly arrived Bagno Vignoni , the ideas for the structure of a film were entwined aroud a story he liked. I remember when we entedred the little church on the edge of the water-filled square, wher mist rising from the water gave a sense of distance to the landscape of ancient houses. The warm light that morning streamed through the dusty windows and came to the rest on faded decorations on a wall. He surprised me sitting on a pew, as though I were just the right shadow to accentuate the caress of the sun on the walls beyond my dark body.

These images leave with us a mysterious and poetic sensation, the melancholy of seeing things for the last time. It is as though Andrey wanted a swift way to pass on his own enjoyment to others. They are something to be shared, not only a method of making is own wish to stop time come true. And they feel like a fond farewell.» (Tonino Guerra in A Fond Farewell. Instant Light - Tarkovsky Polaroids. Edited by Giovanni Chiaramonte and Andrey A. Tarkovsky. London: Thames & Hudson, 2004).

Tarkovszkij, por sua vez, registará no seu Diari: Martirologio, a 26 de Abril de 1980, o que efectivamente seria a formatação da ideia previamente concebida no seu espírito, como se o local finalmente descoberto para a sua Nostalghia, e, no fundo, para aquela outra nostalgia, ou para as várias nostalgias latentes, fosse, já de si, uma alteração, mental, dele próprio, enquanto local original e real, e, por isso, uma imagem artística construída a partir de elementos factuais, mas aberta a todas as possibilidades:

«The first half of the film will problably be set in Bagno Vignoni. But not in the real place - in an invented one. Where there is only the pool, and everything is dilapidated, more intimate, more provincial. From the very beginning, everything will take place near the pool by the hotel. Therefore I shall have to recreate the atmosphere of the place in detail

O que nos leva a interrogar-mo-nos sobre o processo de criação e sobre a relevância das imagens e da sua procura, mesmo que apenas matizadas interiormente e completamente autónomas da realidade, ou seja, a relevância para a imagem e criação artística entre o que é do domínio do inconsciente e do consciente. Acompanhemos Andrej, de novo, agora em Time Within Time: The Diaries 1970-1986, na entrada correspondente a 3 de Julho de 1975:

«How does a project mature? It is obviously a most mysterious, imperceptible process. It carries on independently of ourselves, in the subconscious, crystallizing on the wall of the soul. It is the form of the soul that makes it unique, indeed only the soul decides the hidden ´gestation period` of that image which cannot be perceived by the conscious gaze».

E o que é uma imagem artística?:

03.Fev.1974: «An artistic image is one that ensures its own develpment., its historical viability. An image is a grain, a self-evolving retrocative organism. It is a symbol of actual life, as opposed to life itself. Life contains death. An image of life, by contrast, excludes it, or else sees in it a unique potential for the affirmation of life. (...) Whatever it expresses - even destruction and ruin - the artistic image is by definition an emboyment of hope, it is inspired by faith» ( Time Within Time: The Diaries 1970-1986).

E que Nostalghia ou nostalgias imanam da imagem artística? Tarkovszkij encerra, agora em Sculpting in Time:

«The image is not a certain meaning, expressed by the director, but the entire world reflected as in a drop of water.»

E voltamos ao início: de uma imagem, de um Tempo di Viaggio, ou de uma viagem ou viagens, e de uma geografia latente, pode partir-se para a busca de um sentido, de uma nostalgia, mesmo já interiorizada anteriormente, e, se quisermos, para a realização e significado de uma arte aí encontrada ou produzida. Num instante de luz.

Passagem: Luce Istantanea; Tarkovsky Polaroids

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fevereiro 06, 2007

Tempo di Viaggio: uma Nostalghia (3)

Nostalghia.com, Kimitoshi Sato (Reports of Andrey Tarkovsky's Society of Japan)

Madonna del Parto, Piero della Francesca (Capela do Cemitério, Monterchi, Província de Arezzo, Toscana, Itália)

Bagno Vignoni (Província de Siena, Toscana, Itália)

Passagem: The Geography of Nostalghia; Samples from the Japanese Tarkovsky Photobook; Tarkovsky`s Tuscany; San Galgano Abbey

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fevereiro 04, 2007

Tempo di Viaggio: uma Nostalghia (2)

Nostalghia (1983), Andrej Tarkovszkij
É na Toscana que a busca de Andrej Tarkovszkij, iniciada, com o poeta de Santarcangelo di Romagna Tonino Guerra, em 1979, em Tempo de Viaggio, vai terminar. Andrej encontra nas planícies e colinas da Itália central o desfecho da sua pesquisa, a sua Nostalghia, como também aí, por sua vez, encontrará Andrei Gortchakov - o personagem central do filme de 1983 - o sentido da sua procura e da sua nostalgia, ao seguir a biografia do compositor russo, do século XVIII, Maksim SazontoviC Berezovskij, também ele, a seu tempo, imerso na sua nostalgia. Tarkovszkij, Gortchakov, Berezovskij: viagem sobre viagem sobre viagem sobre nostalgia.
Toscana, Itália
Passagem: Toscana

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